Caros Leitores, apresentamos aqui, uma reprodução da grande entrevista realizada pelo JN á Presidente do Conselho de Administração da STCP, a Dra Fernanda Meneses.
Foram aqui abordados diversos assuntos relativamente á empresa, como por exemplo, o passivo aflitivo da STCP, as Estações de Recolha, ou a Nova Rede.
Toda a entrevista e as imagens aqui reproduzidas são da autoria do
Jornal de Noticias.
"Apoio do Estado à STCP "é claramente insuficiente"
Natural de Moimenta, Cinfães, Fernanda Meneses, 66 anos, assumiu a presidência da STCP em Abril de 2006. Oito meses depois, com a mudança total da rede de autocarros, enfrentou uma onda da manifestações públicas de contestação. Garante que as mudanças operadas entretanto não foram motivadas pelo protestos e admite que a situação financeira da empresa é "normalmente preocupante".
O apoio financeiro do Estado é "claramente insuficiente", mas compreensível". A acção judicial da Câmara do Porto a reclamar a maior parte do património da empresa inclui imóveis "sem sentido nenhum". A queda no número de passageiros com a entrada em operação do Metro deve ser menor do que o previsto. Fernanda Meneses, presidente da Conselho de Administração da STCP, na primeiro pessoa.
Jornal de Notícias - Estava à espera de tanta contestação à nova rede de STCP?
Fernanda Meneses - Com a implementação da última fase da mudança, é evidente que a contestação era esperada. Implicava mudanças muito fortes.
Houve uma falha de comunicação com as pessoas?Não creio. É evidente que a campanha de informação podia ser sempre maior, mas relembro que se fizeram não sei quantos spots de rádio, de televisão, publicações
Podíamos ter multiplicado isso, mas será que tinha tido efeito? Concluímos que não. Temos a certeza de que as pessoas não tinham prestado atenção a esta informação. O que é natural. Sabemos que vamos ter de enfrentar qualquer coisa, mas nunca nos preparamos. Tentámos transmitir que havia mudanças, mas não é fácil chegar a algumas pessoas. Fizemos brochuras em que se dava nota que percurso X passaria a ser assegurado pela linha Y ou com transbordo para o metro ou para outra linha da STCP. Mas a verdade é que isso não atingiu muitas pessoas. Alguma gente, sim. E os que ficaram elucidados não contestaram.
Quem está contra normalmente faz sempre mais barulho...
Julgo que foi por causa da visibilidade exterior que teve a contestação que recebemos uma coisa que não é vulgar - cartas a elogiar o serviço. Outro fenómeno que temos de pensar é que o negócio da STCP, principal operador desta zona, abrange centenas de milhares de pessoas e, que me lembre, as manifestações nunca tiveram mais de cem ou cento e tal participantes. Dá a noção da percentagem. É evidente que o barulho foi tanto que, efectivamente, naqueles moldes e com aquela expressão, não pensámos que fosse existir.
E logo nos primeiros meses foram implementadas cerca de duas dezenas de alterações.
Antes ainda da implementação da nova rede, e no decurso da discussão com as autarquias, tínhamos elencado alguns pontos duvidosos que elegemos como pontos críticos prioritários. Comprometemo-nos a tratá-los logo em Janeiro, o que aconteceu. Mas não tiveram nada a ver com as contestações, que começaram a partir daí. As alterações não tiveram rigorosamente nada a ver com protestos públicos. E convém dizer que se misturam questões que não têm a ver com a nova rede. Embora não deixem de ser necessidades que as populações sentem, não têm a ver com a nova rede, porque a rede antiga nunca serviu esses pontos, da forma que está ser requerida.
A rede obriga a mais transbordos, a maior parte feita em zonas sem condições. Há projectos para melhorar essas áreas?
De facto, há mais transbordos, mas os transbordos não têm um peso significativo, representam 2,8% ou 2,9%. No entanto, é evidente que as condições nos pontos de transbordo são fundamentais. Estamos a fazer um levantamento exaustivo das condições das paragens com maior movimento e dos pontos de interface. De todos os concelhos que servimos, apenas falta Valongo, que está em fase de conclusão. No Porto, contemplámos também os corredores bus. Com o levantamento feito, estamos a tratar o assunto com cada câmara. Tivemos grande receptividade. Vai-se hierarquizar o carácter de urgência e de importância de cada um dos pontos propostos, para estabelecer um plano de intervenção.
Os estudos elaborados para a nova rede diziam que a empresa ia perder 300 mil dos 900 mil passageiros para o metro. Esse cenário confirmou-se?É preciso fazer um esclarecimento prévio. Os números de passageiros da STCP que historicamente foram sendo apresentados assentavam numa bilhética diferente. Para calcular o número de passageiros, aplicava-se coeficientes multiplicadores a cada um dos tipos de título pelo número de utilização/mês que foi obtido através de um inquérito. A partir de Janeiro, a bilhética sem contacto permitiu-nos ter uma estatística objectiva e verificámos que sempre tivemos uma estatística de passageiros muito sobrevalorizada. Temos, nesta altura, cerca de 435 mil passageiros, sem contabilizar os que utilizam agente único, que correspondem a mais alguns milhares. O estudo dizia que a procura, por consequência do aparecimento do metro, decresceria 30%. Com a evolução que as coisas tomam, claramente não atingiremos esse número. Vamos mitigar essa perda.
A situação financeira da STCP é preocupante...
... É normal, é normalmente preocupante.
... mas como é que se pode inverter essa situação?
Os subsídios que nós recebemos provêm do Estado e têm sido concedidos através das indemnizações compensatórias, cujo montante é variável.
Mas insuficiente...
Para os resultados operacionais, é claramente insuficiente. Nos dois últimos anos, as indemnizações compensatórias andaram pelos 16 milhões de euros. Vejamos 16 milhões para fazer face a 31,6 milhões em 2005 e a 41 milhões em 2006 são claramente insuficientes. Percebe-se, há limitações. O Estado não tem, com certeza, disponibilidade para atribuir mais. Acontece que, depois, continua-se a recorrer ao financiamento bancário, acumulando-se o défice. De sensivelmente 75 milhões de passivo em final de 1998, nós, em final de 2006, tínhamos quase 247 milhões. A evolução é clara. Isto também se transforma numa pequenina bola de neve, na medida em que quanto maior for o endividamento, maiores são os encargos financeiros. Como inverter? Aquilo que se procura, essencialmente, é fazer com que o desequilíbrio em cada exercício seja menor.
Um documento interno da Metro alertava para uma eventual suspensão do serviço, caso o Estado não dê mais apoio. Na STCP põe-se essa hipótese?
Não. Obviamente que não vou discutir a situação da Metro, que é diferente. A Metro está numa situação do ponto de vista do endividamento totalmente diferente da STCP, porque é um investimento fortíssimo no lançamento de um sistema de raiz. Mas nunca se pôs, na STCP, a hipótese de parar. Apesar deste panorama, que é normal, a questão nunca foi colocada.
Será inevitável a STCP viver sempre nesta situação de grandes dificuldades financeiras?
Não vejo, sinceramente, nem que tivesse 20 anos, que a STCP, com o serviço que tem de prestar, pudesse ter resultados positivos sem subsídios. A STCP presta um serviço social que representa praticamente um terço do seu serviço total. Significa que tem linhas, por exemplo, onde as validações por quilómetro não chegam a duas. Não perde todo o dinheiro, mas perde quase todo. Isso é serviço social. Acontece quando se faz horários de madrugada, serviço nocturno ou serviço a determinados pontos que não têm procura suficiente.
Sendo assim, seria lógico, então, que o Estado apoiasse mais a operação da STCP, ou não?
Tudo é lógico, mas temos de compreender que é preciso conciliar aquilo que seria desejável com aquilo que está disponível. Mas obviamente que a STCP careceria de uma subsidiação maior. Julgo que também a merecia.
Autocarros cumprem
Considera que o sistema de transportes da Área Metropolitana do Porto funciona bem?
Sinceramente, acho que nós não temos um mau sistema de transportes. Até porque, e temos de reconhecer, as melhorias que a CP introduziu e o aparecimento do sistema de metro - ambos sistemas que têm uma fiabilidade enorme, que podem cumprir horários rigorosamente - acrescem qualidade à região que estão a servir. Por outro lado, e no que diz respeito à STCP, se é verdade que todos os dias há reclamações porque determinado autocarro não cumpriu horário, também é verdade que temos um nível de cumprimento do serviço na ordem dos 98%. Se a STCP circulasse só em corredores de transportes públicos teria um serviço mais fiável.
Mercado frio congela venda de terrenos
A Câmara reclama judicialmente parte substancial do património da STCP. Como está o processo?
A Câmara interpôs uma acção reclamando património imobiliário, mas devo dizer que também reclamapatrimónio que não tem sentido nenhum. Eu estava na administração quando a STCP adquiriu terrenos em Gaia, Gondomar e na Maia para relocalizar as suas estações de recolha e isso passou-se em anos em que a Câmara não tem rigorosamente nada a ver com a empresa, que é sociedade anónima desde 1994. Mesmo quanto ao resto, e não vamos agora estar a dirimir uma questão que está a ser dirimida juridicamente, é questionável se a petição judicial da Câmara é justa. Terão de ser os tribunais ou qualquer acordo a decidir. Pessoalmente, penso que a Câmara quer salvaguardar uma hipótese de indemnização do Estado, relativamente ao património que é a da STCP e foi dos serviços de transportes colectivos.
Já falou com o presidente da Câmara do Porto sobre isso?
Especificamente sobre isto, não.
Mencionou terrenos adquiridos em Gaia, Gondomar e Maia, para estações de recolha. A administração anterior abandonou a ideia e decidiu vendê-los. Já foram vendidos?
Não. Quanto a terrenos, uns deverão ser alienados, mas temos que conseguir uma valorização suficiente. O de Gondomar tem um contrato-promessa de compra e venda, assunto que já veio nos jornais e é de conhecimento público, mas houve um incumprimento do contrato-promessa, já estávamos nós cá e, pura e simplesmente, ficou sem efeito. Há agora um processo em que o promitente comprador quer reaver o sinal que tinha pago, mas também será o tribunal a decidir se isso é justo ou não. Procuramos também validar os locais que estavam mais ou menos definidos para relocalização das duas estações de recolha. A Via Norte está praticamente assente que ficará, estamos a fazer o apuramento final entre S. Roque e Gondomar.
A administração anterior já tinha decidido que seriam a Via Norte e S. Roque.
Foi a decisão do conselho de então perfeitamente legítima.
Mas está a ser reavaliada...
Estamos a concluir a avaliação.
As estações desactivadas serão alienadas?
Em princípio sim, porque a STCP não tem vocação para ser um proprietário imobiliário, sobretudo quando tem as dificuldades que tem. Agora, o que não vai é vender numa época em que as coisas não estejam suficientemente valorizadas. Aliás, fizemos há pouco tempo uma consulta ao mercado nesse sentido. Verificámos, contudo, que o mercado ainda está relativamente frio.
Não se fará sede nova
O projecto de construção da nova sede, em Massarelos, foi adiado?
Foi feito um projecto para a construção de um edifício junto à Rua de D. Pedro V, mas a STCP está numa sede nova. Está aqui [Torre das Antas] desde 1998, numa sede que foi adquirida em leasing e que acabará de pagar em 2008. Temos boas instalações, não nos agradou demasiado a construção de um edifício ao lado do Museu de Massarelos e, sobretudo, não vimos, do ponto de vista financeiro, qual o interesse de estar a fazer um esforço de investimento forte com um objectivo que, sinceramente, não consideramos necessário."